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Desafios econômicos ficaram em segundo plano no discurso de posse de Cristina Kirchner, no sábado (Foto: Divulgação)
Que a Argentina de 2011 é substancialmente diferente da que foi às ruas há dez anos, é consenso entre analistas, observadores, turistas e cidadãos. Que há problemas remanescentes – e aos montes –, nem mesmo o governo de Cristina Kirchner, empossada no sábado (10) para seu segundo mandato, até 2015, está disposto a negar. Mesmo relutante em admitir certas realidades, a presidenta tem um o cenário de desafios a cumprir mesmo após uma década de crescimento econômico e transformações sociais. E não falta a quem culpar pelas pendências.
A vitória obtida em outubro, com 54% dos votos válidos, permite supor que a maioria da população vê o atual caminho como correto. O governo que tomou posse já encontra situação diferente. Nas semanas que antecederam o triunfo eleitoral e nas que se seguiram, Cristina e seus ministros abordaram principalmente as questões econômicas, que consideram prioritárias para um momento em que se agrava a crise internacional – a redução de subsídios, o rastreamento do trajeto do dólar cuja cotação era ascendente por causa da especulação e a reabertura do diálogo pacífico com os produtores rurais entram nessa conta.
2001 | 2003 | 2010 | |
---|---|---|---|
Desemprego | 23,6% | 20,4% | 7,4% |
Taxa de pobreza na Grande Buenos Aires | 25,5% | 39,4% | 8,2% |
Dívida pública em relação ao PIB | 166,4% | 46,3% |
Nos últimos oito anos, o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 64% e a taxa de pobreza nacional caiu de 54% para 8,3%. Números que não deixam dúvida sobre a mudança de situação. Se é hora de ganhar em qualidade, como diz o governo, Atílio Borón, professor do Programa Latino-americano de Educação a Distância em Ciências Sociais, entende que a opção deve ser por apagar as marcas do neoliberalismo que imperou em diferentes períodos.
As heranças são a Carta Orgânica do Banco Central, formulada por Domingo Cavallo, ministro da Economia de Carlos Menem (1989-99), e a Lei de Entidades Financeiras, de Martínez de Hoz, titular da mesma pasta durante a ditadura (1976-83). Ambas manifestam uma crença no livre-mercado e na desregulação do capital. “A proposta de Cristina é um capitalismo racionalmente organizado”, diz Borón, que acredita que esta tentativa de ordem desembocou em uma concentração com características de monoólio. “Por mais que se queira um capitalismo sério e nacional, resulta debochado e transnacional.”
A inflação foi o grande problema de credibilidade dos governos kirchneristas. Pesa a suspeita de manipulação sobre o Instituto Nacional de Estatísticas, uma visão reforçada pelo dia a dia, em que os preços sobem com rapidez. Desde fevereiro deste ano, a alta de preços oficial apresentada é de 0,8% ao mês, sem variação – comportamento que dá contornos definitivos à acusação de maquiagem de dados. Institutos privados fazem estimativas de inflação de 20% a 25% ao ano, dependendo da fonte.
inflação média anual | % |
---|---|
de 1975 a 1991 | 788% |
de 1992 a 2001 | 4% |
de 2002 a 2010 | 13% |
Uma das dificuldades no campo econômico é a aceleração do investimento privado. O empresariado segue reticente a injetar dinheiro em uma economia marcada historicamente por planos econômicos imprevistos que resultaram em perdas. Embora o investimento bruto tenha crescido desde 2003, o aporte em máquinas e equipamentos tem um patamar muito parecido, em termos proporcionais, ao que se registrava no governo Menem, sinal de que a industrialização enfrenta dificuldades.
investimento bruto em % do pib |
investimento bruto em máquinas e equipamentos em % do pib |
|
---|---|---|
1993
|
19,1% | 5% |
1999 | 18% | 4,6% |
2000 | 16,2% | 4,3% |
2001 | 14,2% | 3,6% |
2002 | 12,0% | 3,4% |
2003 | 15,1% | 4,2% |
2004 | 19,2% | 5,4% |
2010 | 22,0% | 5,5% |
Direitos humanos
Foi em 2003 que Néstor Kirchner tomou a decisão de exigir a revogação das leis de Obediência Devida e Ponto Final, que garantiam a anistia a torturadores da ditadura. Segundo dados atualizados até novembro, são 381 causas, 71 delas julgadas (18,5%). Há 1.226 colaboradores do regime prontos a serem levados a júri. O Centro de Estudos Legais e Sociais contabiliza ainda:
- 1.778 pessoas acusadas por crimes de lesa-humanidade – 856 de 2007 em diante
- 229 condenados
- 20 absolvidos
- 336 processados sem prisão preventiva
- 398 processados com prisão preventiva
- 285 falecidos, dos quais 5 condenados antes da morte
No campo das conquistas sociais entram ainda a regulação dos meios de comunicação, a equiparação dos direitos dos casais hetero e homoafetivos e a discussão de uma nova legislação sobre o aborto.
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