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Série de ameças telefônicas contra a defensora dos direitos humanos Lygia Zamali
Fernandes
recebeu a oitava ameaça telefônica anônima no espaço de doze dias. Nesta mesma noite a mãe
da defensora, residente em outra cidade, recebeu uma série de ligações também anônimas
pedindo que sua filha deixasse de exercer seu trabalho.
Lygia Zamali Fernandes é assessora técnica da Federação das Comunidades da Gleba Lago
Grande (FEAGLE) composta por 140 comunidades tradicionais no estado do Pará, dentro
amazônia brasileira. O trabalho da federação pauta-se pela luta por direitos econômicos, sociais e
culturais para as famílias dentro das comunidades. Além de sua função dentro da FEAGLE, a
defensora trabalha em conjunto com outras associações da região do Alto Tapajós, estado do
Pará, auxiliando na comunicação entre as reivindicações dos defensores dos direitos humanos e
as autoridades governamentais competentes.
Segundo informações recebidas, na ligação na noite de 29 de fevereiro a pessoa que fez a
chamada ficou em silêncio apenas escutando a voz da defensora que se encontrava em São
Paulo. No entanto as ligações recebidas por sua mãe na cidade de Santarém, a mais de 3000km
de distância de São Paulo, aconselharam-na à pedir que Lygia Zamali Fernandes “parasse de
mexer com isso” referindo-se ao trabalho em direitos humanos desenvolvido por ela.
Segundo nos foi relatado a primeira ameaça telefônica sofrida pela defensora dos direitos
humanos ocorreu no dia 18 de fevereiro às 10:48 da manhã em que um homem com o sotaque
aparentemente de São Paulo disse à defensora “você está trabalhando muito, descansa, eu
gostaria de te avisar uma coisa para o seu bem, para de ajudar essas pessoas porque a coisa
está ficando muito séria e pode ficar muito séria para você, falo isso pro seu bem, você nem eles
tem poder para isso! Já imaginou você é muito nova tem um filho pequeno, não volta para cá,
você está correndo risco”. No mesmo dia por volta das 15:00 horas a mesma pessoa ligou
chamando Lygia Zamali Fernandes de “muito teimosa, e gente teimosa morre cedo”. A defensora
recebeu ligações diárias entre 18 e 24 de fevereiro com ameaças similares, sempre entre 10:30 e
10:40 da manhã.
No dia 17 de fevereiro o Ministério Público Federal ordenou a inclusão de dois defensores dos
direitos humanos no Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos no estado do
Pará. Estes defensores foram responsáveis por uma importante denúncia de extração ilegal de
madeira amazônica que estava ocorrendo na reserva extrativista Riozinho do Anfrísio e na
Floresta Nacional Trairão. O processo para se chegar a esta decisão contou com a assistência e
acompanhamento da defensora dos direitos humanos Lygia Zamali Fernandes. Um terceiro
defensor dos direitos humanos que participou desta mesma denúncia foi assassinado dias depois
de seu envio.
A Front Line Defenders acredita que as ameaças contra Lygia Zamali Fernandes estão
diretamente relacionadas ao seu legítimo e pacífico trabalho de defesa dos direitos humanos, em
particular em seus esforços relativos à proteção de outros defensores dos direitos humanos, e
está seriamente preocupada com a integridade física e psicológica da defensora.
A Front Line Defenders solicita as autoridades do Brasil à:
1. Assegurar que a investigação às ameaças contra a defensora dos direitos humanos Lygia
Zamali Fernandes seja completa e imparcial, seus resultados publicizados e os responsáveis pelo crime sejam trazidos à justiça de acordo com os padrões internacionais2
2. Tomar todas medidas necessárias para garantir a integridade física de psicológica de Lygia
Zamali Fernandes e de seus familiares;
3. Garantir em todas as circunstâncias que os defensores dos direitos humanos no Brasil
sejam capazes de executar suas atividades legítimas e pacíficas de direitos humanos, sem
medo de represálias e livre de qualquer restrição.
A Front Line Defenders respeitosamente lembra que a Declaração sobre o Direito e a
Responsabilidade dos Indivíduos, Grupos ou Órgãos da Sociedade de Promover e Proteger os
Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais Universalmente Reconhecidos, adotada por
consenso pela Assembleia Geral da ONU em 9 de dezembro de 1998, reconhece a legitimidade
das atividades dos defensores de direitos humanos, assim como a liberdade de associação e de
executar suas atividades sem medo de represálias. Nós gostaríamos de chamar atenção para o
artigo 9 (5): “O Estado deverá proceder a uma investigação imediata e imparcial ou garantir a
instauração de um inquérito caso existam motivos razoáveis para crer que ocorreu uma violação
de direitos humanos em qualquer território sob a sua jurisdição” e para os artigos 12 (2) e (3): “2.
O Estado deverá adotar todas as medidas adequadas para garantir que as autoridades
competentes protegem todas as pessoas, individualmente e em associação com outras, contra
qualquer forma de violência, ameaças, retaliação, discriminação negativa de facto ou de direito,
coação ou qualquer outra ação arbitrária resultante do facto de a pessoa em questão ter exercido
legitimamente os direitos enunciados na presente Declaração” e “3. A este respeito, todos têm o
direito, individualmente e em associação com outros, a uma proteção eficaz da lei nacional ao
reagir ou manifestar oposição, por meios pacíficos, relativamente a atividades, atos e omissões
imputáveis aos Estados, que resultem em violações de direitos humanos e liberdades
fundamentais, bem como a atos de violência perpetrados por grupos ou indivíduos que afetem o
gozo dos direitos humanos e liberdades fundamentais.”
Atenciosamente,
Mary Lawlor
Diretora