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Bianca Costa Porto Alegre (RS)
As mais de 200 famílias da conhecida Vila Chocolatão, no centro de Porto Alegre, capital gaúcha, começaram a ser despejadas de suas casas nesta quinta-feira, dia 12. A remoção deve continuar até o dia 24 de maio, quando a prefeitura da capital, por meio do Departamento Municipal de Habitação de Porto Alegre (DEMHAB), pretende terminar o processo. Algumas famílias serão reassentadas em outro terreno no final da Avenida Protásio Alves. Outros, que não estão cadastrados na prefeitura, deverão ser incorporados em um aluguel social. A vila foi uma das primeiras ocupações da cidade e tem mais de 25 anos de história. Espremido entre os prédios da administração federal, o terreno pertence ao Centro Administrativo Federal de Porto Alegre.
O despejo
A remoção das primeiras casas foi acompanhada por grande parte dos moradores e começou por volta das 8h de quinta-feira. Na primeira quadra da Vila, na casa 15, moravam Ezequiel Javier, a esposa Mayara e a filha de cinco meses. Eles não estão cadastrados na prefeitura para habitar o novo loteamento construído para abrigar 180, das 225 famílias que hoje vivem na Chocolatão. Sem garantias de moradia, o casal não pretendia sair. Representantes do DEMHAB estiveram no local e depois de muitas negociações e promessas da prefeitura o casal conseguiu ser incluído no aluguel social. Eles devem permanecer na Vila Chocolatão, em outra casa, até o dia 24 de maio. Nesse período, os dois deverão procurar um imóvel para alugar no valor de R$350,00, quantia destinada ao aluguel social. Após seis meses, as famílias podem renovar o aluguel por mais um ano, e depois disso, poderão ser incluídos em programas habitacionais, como o Minha Casa Minha Vida. “Depois, vou ter que seguir de novo. Eles vão vir desmontando o resto e eu vou ter que pegar tudo de novo e arrumar até arranjar uma casa para alugar. Daí depois não tem lugar pra ir certo”, relata Ezequiel.
A situação revoltou a advogada Claudete Simas que representa 11 famílias que entraram na justiça para não serem removidas justamente por não terem garantias da prefeitura de que serão reassentadas. Ela diz que os representantes da prefeitura estavam fazendo coação para que o casal saísse de sua casa, mesmo não dando garantias seguras de moradia. “A forma como foi feita a negociação hoje foi das mais cruéis que eu já vi. Pegar dois jovens e colocar na parede e dizer: ‘agora vocês tem que decidir para onde vocês querem ir’. Isso só demonstra que a prefeitura não tem preocupação nenhuma com o bem estar e com a situação das pessoas aqui. A intenção é cumprir a desocupação do espaço, fazer a limpeza urbana. Se eles terão trabalho não é a preocupação dos nossos entes públicos”, relata.
Os trabalhadores
Outro trabalhador que não está cadastrado e também não tem garantias é Darci Rodrigues Cordeiro. Ele não estava presente no dia em que a prefeitura realizou o levantamento para a construção das moradias. “Eu estou me sentindo constrangido, até porque fazem cinco anos que eu vivo aqui. E agora? Ficou o dito pelo não dito”, afirma.
Quem também não está muito satisfeita com a remoção é a dona de casa Marta Suzana Pinheiro Siqueira, que há dois anos vive em uma casa construída de madeira, segundo ela, de boa qualidade. Para Marta, a casa no novo loteamento é menor e será complicado acomodar os quatro filhos nos dois quartos da nova moradia. “É pequeno, são só dois quartos e aqui eu tenho três quartos, sala e cozinha. Para mim, não é privilégio nenhum, é ilusão para bobo. Eu quero ver daqui há dois anos como vai estar. Antes disso, é ilusão”, diz.
Fabiana que administra um galpão na Chocolatão não quer sair do local se não puder levar seus instrumentos de trabalho. “Ou eles dão um terreno para o depósito ou eu vou com os carrinhos lá para o loteamento. Não vou me desfazer do que é meu”, relata.
Adenir Rossi é morador da Chocolatão há cinco anos, mas não quer morar no novo loteamento. Ele relata que conheceu diversos processos de remoção de moradores de locais considerados nobres pelo poder público na capital gaúcha, como a Vila Santa Luzia, no Partenon. “Há 20 anos, a Vila Chocolatão não valia nada, pois era só mato e banhado. Agora que os moradores fizeram moradias acharam bem tirar nós daqui e colocar para lá. Daqui há 20 ou 30 anos eles vão chegar lá e vão tirar o povo de lá porque já compraram a área para fazer prédio ou campo de futebol e assim vão botando o pobre para onde querem”, conta.
O terreno onde muitas famílias vivem há mais de 25 anos pertence ao Centro Administrativo Federal de Porto Alegre. No local deve ser construído um estacionamento para o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) e um novo prédio para o Ministério Público Federal (MPF).