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Por Rodrigo Cruz
Diversidade. Uma característica da qual o Brasil se orgulha, mas que na prática, ainda não é respeitada, e, sobretudo, garantida, pelo chamado Estado de direito. Estamos falando de um País que possui mais de 200 paradas gays, entre elas a maior do mundo (São Paulo), é sede da maior associação de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transsexuais (LGBT) da América Latina (a ABGLT), mas que, contraditoriamente, jamais aprovou em sua esfera legislativa uma única medida a favor de sua população homossexual. O pior de tudo: o Brasil é o país líder em assassinatos de homossexuais no mundo – em média um a cada dois dias, segundo dados da ONG Grupo Gay da Bahia (GGB).
Para se ter uma idéia, em 2009, foram 198 assassinatos documentados. Em 2010, foram mais de 250 assassinatos. Ainda segundo o GGB, proporção de vítimas geralmente é de 70% de gays, 27% de travestis e 3% de lésbicas. Os números, porém, podem ser maiores do que se imagina. Devido à total ausência de estatísticas oficiais sobre crimes de ódio contra lésbicas, gays, bissexuais e transsexuais, a falta de recursos da polícia para identificar casos deste tipo e certo receio por parte das testemunhas em denunciar situações de violência, o cálculo ainda está longe de ser exato.
O Grupo Gay da Bahia realiza o levantamento há 30 anos, baseado em casos divulgados pela imprensa nacional e regional. Já exigiu inúmeras vezes que o Ministério da Justiça e as Secretarias Estaduais de Direitos Humanos assumam o compromisso de coletar os dados. Nunca obteve sucesso.
É com o intuito de pressionar o poder público para a aprovação do Projeto de Lei 122/2006 (que torna crime atos homofóbicos), sensibilizar a sociedade para a questão do preconceito contra as diferentes orientações sexuais e identidades de gênero e principalmente, pedir o fim da violência homofóbica, que militantes da causa LGBT, mobilizados a partir de uma comunidade virtual no Facebook, irão marchar no próximo dia 19, da Praça do Ciclista, rumo a Av. Paulista nº 777, em São Paulo. O local ficou conhecido depois que, em novembro do ano passado, quatro jovens de classe média atingiram um rapaz com uma lâmpada fluorescente na cabeça. O motivo? Acreditavam que a vítima era homossexual.
O episódio, no entanto, representa apenas a ponta de uma enorme teia de violência (muitas outras agressões ocorreram posteriormente em São Paulo, inclusive de homens contra mulheres homossexuais). Causa revolta que alguém seja agredido por ser homossexual em plena Av. Paulista, conhecida justamente por receber a maior parada gay do mundo, mas a homofobia é ainda pior nas capitais mais distantes do eixo sul-sudeste, no interior do país, nas pequenas cidades aonde a imprensa não chega e aonde o preconceito sequer é questionado.
Tal qual o machismo, a homofobia está presente no cotidiano dos brasileiros, e se engana quem pensa que ela atinge somente os homossexuais. Se você é heterossexual, mas simplesmente não se enquadra nos ditos padrões de comportamento do homem (ou da mulher) “tradicional”, então provavelmente você já foi, ou será, vítima de homofobia. Trata-se, sobretudo, de um preconceito de gênero.
É por isso que, além de exigir a aprovação do PLC 122, instrumento jurídico capaz de garantir a integridade física e moral de lésbicas, gays, bissexuais e transsexuais, é preciso informar e conscientizar a sociedade. Para a marcha do dia 19, os organizadores preparam panfletos que explicam os reais objetivos do projeto de lei e desmistificam a idéia, amplamente difundida por setores fundamentalistas, de que o projeto impede a liberdade de expressão e culto das igrejas, já que para elas, a homossexualidade é considerada um pecado. O argumento, que pode ser contestado por qualquer um que tenha acesso ao texto integral do PLC, tem sido utilizado insistentemente pela bancada evangélica do Senado para barrar sua aprovação. Enquanto isso, milhares morrem em segredo.
O assunto também tomou conta do segundo turno das eleições presidenciais do ano passado, quando os candidatos José Serra (PSDB) e Dilma Rousseff (PT) utilizaram o debate fundamentalista para ganhar parte do eleitorado evangélico, órfão da então candidata Marina Silva (PV) derrotada no primeiro turno. Dilma e Serra tiveram reuniões a portas fechadas com lideranças religiosas e a atual Presidente da República chegou a redigir uma carta a estes setores esclarecendo suas opiniões sobre o aborto e a PLC 122. Na época, a ABGLT lançou um manifesto direcionado aos candidatos, pedindo a manutenção de um debate livre de concepções religiosas.
Unidos contra a homofobia
Logo após os ataques na Av. Paulista, o militantes LGBT organizaram uma série de manifestações, que culminaram na criação de uma Frente Paulista Contra a Homofobia, que reúne grupos LGBT, ONG’s, representantes da sociedade civil, de outros movimentos pelos direitos humanos e também de órgãos públicos, com o intuito de enfrentar a crescente onda de homofobia no Estado. Além de apoiar a marcha do dia 19, a Frente pretende criar um observatório capaz de mapear a violência contra a população LGBT em São Paulo.
Rodrigo Cruz é jornalista e integrante do Coletivo LGBT 28 de Junho
SERVIÇO:
Marcha Contra a Homofobia
Data: 19 de fevereiro de 2011
Local: Praça do Ciclista, Av. Paulista esquina com a Av. da Consolação
Horário: Concentração às 15h
Itinerário: O grupo sai em marcha da Praça do Ciclista e segue em direção ao edifício 777 da Av. Paulista