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Da Redação Michelle Amaral
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) aprovou, no dia 16 de junho, a Convenção sobre o Trabalho Decente para as Trabalhadoras e os Trabalhadores Domésticos. A resolução atende à reivindicação histórica da categoria por equiparação de direitos com os demais trabalhadores.
Em todo o mundo, segundo estimativas da OIT, o trabalho doméstico emprega entre 53 e 100 milhões de pessoas. No Brasil, conforme dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), existem 7,2 milhões de trabalhadores domésticos. Destes, 93% são mulheres e menos de 2 milhões, apenas, possuem carteira assinada.
Contudo, mesmo as que possuem registro formal de trabalho não têm assegurados todos os direitos trabalhistas. O artigo 7º da Constituição Federal, que define os direitos de todos os trabalhadores, em seu parágrafo único restringe o acesso das trabalhadoras domésticas a parte desses benefícios. Além disso, não há regulamentação sobre a jornada de trabalho para a categoria, o que permite que se imponha a estas trabalhadoras uma carga horária excessiva.
Em seu discurso durante a 100ª Conferência da OIT, na qual os delegados dos 183 países-membros aprovaram a Convenção, o ministro do Trabalho brasileiro, Carlos Lupi, reconheceu que as trabalhadoras domésticas têm sido as mais negligenciadas no mundo.
“Estou certo de que a aprovação deste instrumento representa para todos uma oportunidade histórica de preencher uma das mais graves lacunas no conjunto normativo da OIT”, defendeu o ministro.
A presidente da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad), Creuza Maria Oliveira, explica que as trabalhadoras domésticas têm se organizado há 70 anos no Brasil em luta pelo reconhecimento de seus direitos. O trabalho doméstico só foi reconhecido como profissão a partir do Decreto 71.885, em 1973. “Houve conquistas durantes esses anos e, agora, com a Convenção, temos o resultado da nossa luta de muito tempo”, conta Creuza Maria.
A questão do trabalhado doméstico começou a ser debatido pelo Conselho de Administração da OIT em 2008, quando houve a decisão de colocá-lo na agenda da Conferência. Em 2010 foi realizada a primeira discussão do tema, que foi aprofundado neste ano, culminando na aprovação da norma.
De acordo com o ministro Carlos Lupi, a Convenção será apresentada à presidente Dilma Rousseff para que, o quanto antes, o Brasil seja signatário da recomendação.
Mudanças
No entanto, para aplicar a norma, o Brasil terá que retirar o parágrafo único do artigo 7º da Constituição. Para isto, deverá ser encaminhada ao Congresso uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que, se aprovada, garantirá às trabalhadoras domésticas todos os direitos previstos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Segundo informou o ministro do Trabalho, a PEC deve ser encaminhada até o final do ano, além disso, serão formulados estímulos para que os empregadores formalizem o vínculo com as trabalhadoras.
Na prática, os direitos que serão acrescidos às trabalhadoras domésticas são: jornada de trabalho não superior a 8 horas diárias e 44 semanais; pagamento de horas extraordinárias; adicional noturno e hora reduzida; adicional de insalubridade; adicional de periculosidade; salário-família, concedido pela Previdência Social para ajuda no sustento de filhos de até 14 anos; multa rescisória; redução de horário durante o aviso prévio; assistência na rescisão contratual; entre outros.
Hoje, a partir do conjunto de leis e decretos que tratam da categoria, as trabalhadoras domésticas gozam de direitos como registro na Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS), 13º salário, repouso semanal remunerado, feriados civis e religiosos, férias de 30 dias remuneradas, licença-maternidade aposentadoria, vale-transporte e integração à previdência social. O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e o seguro-desemprego são opcionais, ficando a critério do empregador conceder ou não.
Formalização
Muitas trabalhadoras domésticas, contudo, ainda trabalham na informalidade. De acordo com um estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), apenas 29% têm registro em carteira.
É o caso de Terezinha Teles, de 57 anos, que trabalha como diarista. “Comecei a trabalhar como diarista há seis anos, mas nunca fui registrada”, conta. Terezinha, no entanto, não se preocupa com o registro em carteira. “Tenho sempre o meu dinheiro e não dependo de ninguém”, afirma.
No entanto, como explica Eliana Menezes, presidente do Sindicato das Empregadas e Trabalhadores Domésticos da Grande São Paulo (Sindoméstica), o baixo índice de trabalhadoras domésticas registrados pode ser atribuído ao fato de “a empregada muitas vezes não ter conhecimento de seus direitos”. Mas também pelo “o empregador não querer arcar com as despesas [resultantes do registro], que não são tão grandes assim”.
Eliana lembra, por exemplo, que os empregadores podem, de acordo com a Lei 11.324 de 19 de julho de 2006, deduzir de seu Imposto de Renda os 12% sobre o valor do salário mínimo pago ao trabalhador doméstico.
Ana Lúcia Araújo, de 61 anos, trabalha desde os 12 anos como empregada doméstica. Durante 49 anos trabalhou em diversos lares e, em muitas ocasiões, sem o registro formal. “Trabalhei por 20 anos em um apartamento, ia 3 vezes por semana. Sempre pedi aos meus patrões que me registrassem, mas eles não queriam”, relata a trabalhadora.
Segundo ela, somente depois de pedir a conta e procurar o sindicato da categoria, conseguiu assegurar o cumprimento de seus direitos. “O meu patrão ficou bravo, mas teve que acertar o meu registro em carteira e os pagamentos ao INSS, para que eu pudesse me aposentar”, completa.
Para ela, a aprovação da Convenção é uma vitória para todas as trabalhadoras domésticas e o resultado da luta que travam há anos. “Se a gente não brigar por nossos direitos, quem vai brigar?”, indaga.
Apesar de ter conseguido se aposentar, Ana Lúcia continua trabalhando para completar a renda de sua família. E este é um outro problema enfrentado pela categoria: a remuneração. O Ipea aponta que, em 2009, o salário médio dos trabalhadores domésticos alcançou R$ 386,45, 18% abaixo do salário mínimo nacional, na época R$ 465,00.
A trabalhadora acredita que a nova regra, se adotada pelo Brasil, trará melhores condições de vida e trabalho.
Convenção
Para que entre em vigor, a Convenção deve ser ratificada por pelo menos dois países. Filipinas e Uruguai já manifestaram a intenção de ratificá-la.
Este é o primeiro instrumento jurídico internacional que abrange o trabalho doméstico. Os delegados da 100ª CIT adotaram a Convenção por 396 votos a favor, 16 votos contra e 63 abstenções, e sua Recomendação, que reafirma a necessidade de ratificação da norma pelos países-membros da OIT, por 434 votos a favor, 8 contra e 42 abstenções.