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Foto: Camila Hoshino
A situação de cerca de 180 casas à margem de um córrego de menos de cinco metros de largura, no Jardim Eldorado, vila de trabalhadores da Cidade Industrial (CIC), antiga área de ocupação, evidenciam os problemas da política de realocações da Companhia de Habitação de Curitiba (Cohab-CT).
Desde 2008, a Associação de Moradores é autora de ação de usucapião coletiva, que garante a posse dos lotes enquanto a regularização estiver pendente. No entanto, parece que o pretexto de revitalização do “rio” é um argumento que pesa mais na tomada de decisões do poder público do que a necessidade objetiva desses trabalhadores e moradores antigos. Isso porque a realocação não prioriza quem tem urgência devido à péssima situação das casas, mas enfoca desordenadamente os moradores que não querem a saída e que nunca foram afetados por enchentes ou demais riscos ambientais. Nesse contexto, cerca de 50 famílias já foram realocadas.
As casas têm sido derrubadas, e os materiais não são removidos da beira do córrego. Pedaços de madeira e pontas de ferro oferecem risco às crianças e têm se tornado focos de doenças. A proliferação da dengue e de animais transmissores são ameaças concretas à saúde da comunidade.
Também não há informações sobre o cronograma de execução: sem prazos, sem participação popular, de forma humilhante para as famílias, esse é o processo que remete a um filme ultrapassado, mas acontece no início de 2011. Em assembleia ocorrida no dia 20 de abril, moradores relatam que indenização e direito de permanência não são palavras mencionadas pela Cohab, e há casos em que nem mesmo é indicada aos moradores outra possível casa em empreendimento da Companhia. As famílias revelam indisposição em mudar para uma casa menor e voltar a pagar prestações, depois de 20 anos assentadas no local.
Há menos de um mês, Claudemir Souza Pardinho quase teve sua casa de seis peças derrubada. Sozinho, ele cuidava dos dois filhos e precisou parar o condutor do trator, que tinha a ordem expressa para derrubar a residência vizinha e a sua. “As paredes de casa trincaram e agora há o entulho. O motorista do trator não sabia que tinha gente morando, disse que a Cohab liberou para derrubar todas as casas naquele trecho”, narra. Este trabalhador soma-se ao caso dos que vivem em mais de uma família no mesmo lote. No caso dele, a Cohab garante apenas a realocação do seu sogro, cujo nome está anotado no cadastro. Mas a realocação de Claudemir não está sinalizada.
Os moradores já passaram por um cadastramento há quatro anos, organizado pela Associação de Moradores. A Cohab há pouco tempo realizou novos cadastros, mas não contemplou todos os habitantes da região. Um dos moradores contou, durante a assembleia, que trabalhava em Joinville, não foi inscrito pela Cohab, retornou e agora está em dúvida quanto à situação do seu lote.
Trata-se de uma política de realocação que inclui sorteios, falta de informações e critérios, em suma: incerteza. Um cassino por onde já rolaram vidas de moradores das Vilas Iguape I (Boqueirão), Monteiro Lobato (Tatuquara), Mariana, Esmeralda, Rex e Itamaty (Xaxim) – casos marcados por processos mal-conduzidos de realocação, falta de transparência ou ainda pela espera das famílias por anos a fio.
Thiago Hoshino é assessor da Terra de Direitos e Pedro Carrano é repórter do jornal Brasil de Fato