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O governo federal prepara um pacote de medidas para fechar brechas da
legislação de rádio e TV que permitiram o surgimento de um “mercado
paralelo” ligado às concessões no país.
A Folha teve acesso à última versão da minuta do decreto, que foi batizado
pelo setor de “novo marco regulatório da radiodifusão”.
Uma das mudanças de maior impacto é a proibição expressa do aluguel de
canais e de horários da programação de rádio e TV.
A lei atual não proíbe a prática de forma explícita, o que permitiu o
aumento de programas religiosos e exclusivamente comerciais, principais
clientes desses horários.
No fim de 2011, a Igreja Internacional da Graça de Deus, do missionário R.R.
Soares, por exemplo, alugava duas horas e cinco minutos semanais na
Bandeirantes.
Na Rede TV!, o apóstolo Valdemiro Santiago, da Igreja Mundial do Poder de
Deus, comprava cerca de dez horas e meia semanais. A rede de farmácias
Ultrafarma ocupava quatro horas e meia com propagandas.
Na TV Gazeta, o Polishop detinha dez horas semanais para anunciar seus
produtos.
Os dados são do mais recente levantamento do Intervozes, organização que
monitora a programação no país. Segundo a entidade, poucas são as emissoras
que não entraram nesse negócio. Globo e SBT estão entre elas.
A Record é um caso isolado porque seu fundador, Edir Macedo, também é o
responsável pela Igreja Universal do Reino de Deus.
Segundo o Intervozes, a Record diz não ceder seu espaço a terceiros, mas não
explica se paga pelos programas religiosos veiculados, uma forma de se
enquadrar à legislação. Na TV Gazeta, são 26 horas semanais destinadas aos
cultos da igreja.
INVERSÃO
O Ministério das Comunicações não quis comentar as mudanças e informou que o
“novo marco” ainda será colocado em consulta pública.
Caso o decreto seja sancionado como está, obrigará as emissoras a comprar os
programas produzidos por terceiros -ao invés de receber pelo aluguel, como
hoje.
Consultadas, as principais redes não se pronunciaram.
Apesar dos avanços, o governo não define os mecanismos que serão criados
para fiscalizar a prática de eventuais irregularidades.
CONTRAPARTIDA
Ao acabar com o “mercado paralelo”, o governo cortará uma importante fonte
de receita, mas, em troca, permitirá que as emissoras prestem serviços de
dados -atividade restrita às empresas de telecomunicações.
Hoje, as emissoras só podem fazer caixa com a venda de espaço publicitário
-que pode ocupar, no máximo, 25% da programação.
Ao permitir a comercialização do serviço de dados, o governo sinaliza para a
expansão da TV digital no país e do sistema de interatividade que conecta a
TV à internet.
Esse serviço permitirá ao telespectador comprar produtos anunciados durante
a programação clicando diretamente na TV. É essa conexão que poderá ser
cobrada.
Por Julio Wiziack, da Folha de S. Paulo