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A não-privatização da Embrapa é uma das principais reivindicações
da Jornada das Mulheres da Via Campesina em Goiás – Foto: Sinpaf
Em audiência realizada na tarde desta terça (06) com integrantes da Via Campesina e do SINPAF, em Brasília (DF), o presidente da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Pedro Arraes, assegurou aos trabalhadores que o governo não permitirá que o Projeto de Lei 222/08 – que propõe transformar a Embrapa em empresa de economia mista com ações negociadas na bolsa – avance para além do Congresso. A pauta é uma das principais reivindicações da Jornada das Mulheres da Via Campesina em Goiás, que desde ontem ocupam a unidade Arroz e Feijão da empresa, no município de Santo Antonio de Goiás.
Segundo o presidente da empresa, a proposta não tem respaldo do governo federal. “Conversei hoje com deputados e com a ministra Ideli (Salvatti), e nossa posição é de defesa da Embrapa pública. A empresa é patrimônio do povo brasileiro, e garanto que não deixará de ser”, afirmou Arraes.
Para Rosana Fernandes, da coordenação da Via Campesina, o compromisso do governo é uma conquista fundamental decorrente da pressão dos movimentos sociais e sindical, mas é preciso discutir com profundidade o modelo de pesquisa e desenvolvimento para o campo levado a cabo atualmente pela empresa. “Questionamos a condução dos projetos da Embrapa e começamos a enxergar um espaço de disputa permanente de agora em diante. Não sairemos daqui totalmente satisfeitas porque, mesmo sem ser privatizada oficialmente, às vezes temos dúvidas se ela é realmente 100% pública. Sabemos que pesquisas desenvolvidas utilizam larga escala de agrotóxicos, por exemplo”.
Controle social
A participação dos movimentos sociais no Conselho de Administração (Consad) da empresa também foi cobrada pelos trabalhadores rurais. O representante da empresa, por sua vez, ponderou que já estão garantidas cadeiras a um representante do Ministério do Desenvolvimento Agrário, a um empregado da empresa e a dois representantes da sociedade civil.
“Sabemos que esses assentos garantidos para fora dificilmente nos englobarão, pois são historicamente ocupados por representantes do agronegócio. É preciso construir um espaço de discussão que apresente questões que precisamos aprofundar, como um programa de pesquisas para a agricultura familiar camponesa agroecológica. O modelo do agronegócio tem consequências trágicas para a natureza, para o meio ambiente e o conjunto da sociedade. Não é possível pensar um novo modelo sem pensar na Embrapa, que até hoje cumpriu papel importante para atender esse modelo atual que chegou ao seu limite. É preciso produzir conhecimento e colocar a serviço da produção de alimentos e por isso não daremos trégua para a Embrapa enquanto não avançarmos nessa perspectiva”, observou Valdir Misnerovicz, da coordenação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em Goiás.
Em resposta, Arraes sugeriu que os movimentos componham os comitês assessores externos (CAE) da empresa, e se comprometeu a apresentar uma proposta de criação de um grupo de trabalho experimental em Goiás para o desenvolvimento de ações voltadas à pequena agricultura.
A deputada federal Marina Sant’Anna (PT/GO), apoiadora dos movimentos sociais no estado, ressaltou que a Embrapa é um espaço privilegiado de pesquisa e indução de desenvolvimento. “As tecnologias que existem podem garantir alimentos saudáveis e para todos, por isso é preciso haver mais incentivo à pesquisa, produção e escoamento da pequena produção”, destacou. Para ela, a ocupação por parte das camponesas também tem conteúdo simbólico relevante. “Mulher se caracteriza pela questão do cuidado. Essa ocupação, portanto, é uma forma de cuidar da empresa. Considero um gesto de bom gosto por parte da Via Campesina, pela estratégia de marco civilizatório. Ocupar a Embrapa é abraçá-la”.
Trabalhadores unidos
Para o presidente do SINPAF, Vicente Almeida, a união entre os trabalhadores rurais e da empresa é fundamental para o avanço de suas conquistas. “Temos várias pautas em comum, sobretudo a preocupação com os rumos institucionais, a gestão participativa da empresa e a agroecologia. Este pode ser um momento-chave para que a Embrapa consiga concretizar sua missão de fortalecimento da agricultura que produz alimentos para o país, gerida com controle social e participação. Estamos felizes pela posição de governo de sustar esse projeto, foi uma conquista muito importante. Mas queremos discutir participação social na gestão da empresa, inclusive para contribuir com o acompanhamento de políticas públicas definidas pelo governo”.
Ao final da audiência, Arraes se comprometeu a conversar com o ministro da Agricultura, Mendes Ribeiro, para que atenda os trabalhadores ainda nesta semana. “Queremos que a Embrapa nos dê retorno com propostas de avanço da pauta apresentada e a garantia da audiência com o ministro, para abrir espaços para esse diálogo”, finalizou Rosana.