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Funcionários do MDA e do Incra fazem manifestação em frente ao Palácio do Planalto
O atual movimento grevista no serviço público brasileiro é particularmente dramático nas instituições que lidam com a problemática da terra. Além das condições salariais e trabalhistas reprimidas frente às outras categorias, servidores do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), da Fundação Nacional do Índio (Funai), do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e da estatal Embrapa cobram do governo a efetiva execução de políticas públicas consideradas estratégicas para o desenvolvimento social do país, como a reforma agrária, a demarcação de terras indígenas e a pesquisa agropecuária.
Alguns sindicalistas avaliam como erro político a postura “intransigente” do governo em relação aos servidores federais. “Há uma contradição. De um lado, abre-se mão de um alto volume de arrecadação, liberando empresários do pagamento de impostos, como é o caso IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), enquanto de outro se promove uma política de contenção de salários e até de retração”, comenta Vicente Almeida, presidente do Sindicato Nacional dos Trabalhadores em Pesquisa e Desenvolvimento Agropecuário (Sinpaf).
Segundo o Ministério do Planejamento, o volume de reajuste salarial pedido pelas categorias em greve pode superar os R$ 90 bilhões, o que afetaria as contas do Estado. “Há um discurso de austeridade por parte do governo comprado pela própria mídia. Mas qual o recurso destinado ao setor público? Já se sabe que a relação entre servidor e população, no Brasil, ainda está aquém das necessidades reais. Especialistas já demonstraram que temos um Estado ‘raquítico’. Além disso, como explicar que gastamos algo como 40% do nosso PIB (Produto Interno Bruto) em pagamento de dívida, uma bolsa-banqueiro que só remunera o capital rentista?”, critica Marcius Crispim, da Associação Nacional dos Servidores do MDA.
No cálculo de Vicente Almeida, para combater os efeitos da crise econômica, o crescimento da massa salarial do trabalhadores deveria ser estratégia, não o contrário. “A gente já sente um certo esgotamento da política de transferência sem que haja um enfrentamento de questões estruturais, como a concentração de renda, a necessidade de um imposto sobre grandes fortunas, a democratização dos meios de comunicação, a reforma agrária, entre outras”, diz.
No campo
Na maior paralisação dos últimos cinco anos, servidores do Incra estão em greve desde o dia 16 de junho. No total, 27 das 30 superintendências regionais tem adesão média de 80% dos funcionários. “A gente tinha muita esperança [no governo Dilma] de que as coisas andariam e nada se concretizou. A reforma agrária continua parada, não houve nenhuma mudança institucional e o Incra permanece na periferia do Poder Executivo”, afirma Acácio Leite, perito federal agrário e membro do comando de greve na autarquia.
O servidor exemplifica a situação lembrando que, até agora, a presidenta publicou somente 60 decretos de desapropriação de terras, tudo no fim do ano passado. O resultado pífio pôde ser percebido no número de famílias assentadas – cerca de 21 mil – , o pior rendimento ao longo dos últimos 16 anos. Para piorar, este ano nenhuma área foi decretada até agora. “Vai ser o pior ano para o assentamento de famílias, além de ser um dos intervalos mais longos da história do Incra sem a emissão de um único decreto de desapropriação de terras”, lamenta Acácio.
Retrocesso
Para um órgão que tem sob sua responsabilidade o atendimento direto de cerca de dez milhões de pessoas que vivem nas cerca de nove mil áreas de assentamento da reforma agrária por todo o país, os números da atual estrutura são alarmantes. Segundo a Confederação Nacional dos Servidores do Incra (Cnasi), o corte no orçamento do instituto, em 2012, chegou a R$ 540 milhões de um total de R$ 1,7 bilhão reservados, inicialmente, justamente os recursos para aquisição de novas áreas.
No MDA, a questão começa na própria estrutura do órgão. Apenas 17% dos funcionários da pasta são servidores de carreira, que somam 127 funções. Desde sua criação, em 1999, o ministério só realizou um único concurso público. Não há plano de carreira e a massa funcional é composta, na sua imensa maioria, por profissionais de vínculo provisório. “Há um perda de conhecimento institucional, porque esses funcionários deixam o órgão e levam as experiências de execução das políticas públicas”, adverte Marcius Crispim, da Associação Nacional dos Servidores do MDA.
O quadro de servidores do Incra também está ameaçado. Dos atuais 5,5 mil funcionários de carreira, cerca de dois mil devem se aposentar até 2014. O último concurso público, realizado há dois anos, até agora não convocou os 400 aprovados.
Em relação à Embrapa, a luta dos trabalhadores da estatal tem se fortalecido após a deflagração da greve, em 25 de junho. A categoria rejeitou por 98% dos votos a proposta de Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) apresentado pela empresa para 2012-2013. A negociação já dura quatro meses, sem sucesso. “Os trabalhadores se uniram para expressar sua insatisfação em relação à tentativa de retirada, por parte da empresa, de direitos conquistados com a luta da categoria, além da inexpressiva proposta de reajuste salarial sem ganho real”, confirma Vicente Almeida, do Sinpaf.
Outra preocupação é a prioridade que a Embrapa confere ao agronegócio em detrimento da agricultura camponesa. Apenas 4% dos recursos de pesquisa são canalizados para esse segmento, responsável pela produção de 70% dos alimentos consumidos no país. “A leitura política de tudo isso é que o governo tem seu projeto estratégico definido, que não aposta na reforma agrária, nos investimentos em tecnologia para o pequeno agricultor. Por causa disso, os movimentos sociais se juntam à pauta dos servidores cuja finalidade é a mesma”, avalia Rosângela Piovizani, do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC) e Via Campesina Brasil.
Indígenas
Na Funai, o problema de quadro funcional reduzido é parecido, mas esconde uma realidade ainda mais grave. Para Fernando Schiavini, indigenista com 37 anos de carreira, a recente reestruturação sofrida pelo órgão, em 2009, parece ter sido pensada para atender tão somente a sanha desenvolvimentista que hegemoniza o centro decisório do Poder Executivo. “O governo promoveu essa falsa reestruturação apenas para facilitar os licenciamentos e autorizações da Funai para realização de obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) em terras indígenas”, critica. Dos 3,1 mil novos servidores prometidos após a remodelação do órgão, apenas 700 foram contratados. “Boa parte desse novos servidores foi lotada na sede da Funai, em Brasília, especificamente no setor que trata de licenciamento”, acrescenta.
Em contrapartida, o atendimento na ponta continua precarizado. Mônica Carneiro, indigenista especializada da Funai em Palmas (TO), unidade que atende 22 etnias em seis estados, é uma das servidoras que entrou no último concurso público de 2010. “Nunca recebemos qualquer tipo de qualificação para exercer as funções do órgão”, observa. O Regimento Interno também não foi aprovado, denuncia a servidora, que ainda critica a inexistência de “participação efetiva de servidores e indígenas nas decisões sobre as atribuições” da autarquia.
Na reestruturação, as unidades da Funai localizadas em terras indígenas seriam extintas e reinstaladas em cidades próximas. “O argumento era bom, prestar atendimento sem interferir na cultura. O problema é que essas unidades, na maioria, ainda não foram criadas e os indígenas ficaram completamente desassistidos pelo Estado”, afirma Schiavini. Segundo o Comando Nacional de greve, pelo menos 22 das 36 Coordenações Regionais da Funai, mais a sede, em Brasília, estão paradas. A adesão atinge em torno de 70% dos servidores, informa a categoria.
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