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A reintegração de posse no Quilombo Rio dos Macacos, próximo à capital baiana, foi adiada em 15 dias. Depois de uma reunião frustrada com representantes do governo federal, no último dia 31, os moradores realizaram protestos na área e em Brasília. Além de manifestações de apoio aos quilombolas por todo o país. Eles asseguram que seus antepassados chegaram ao local há pelo menos 200 anos.
A Justiça Federal havia determinado que as 68 famílias que ocupam uma área de 300 hectares, no município de Simões Filho (BA), deixassem o local no dia 1º de agosto. O território é disputado pela Marinha, que possui uma base e uma vila militar no entorno.
Relatório do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), do final do ano passado, reconheceu a comunidade como remanescente de quilombo. Como o documento não foi publicado no Diário Oficial da União, não houve nenhuma iniciativa que garantisse a titulação das terras.
Em entrevista à Radioagência NP, a trabalhadora rural Rose Meire dos Santos Silva denuncia que os quilombolas são tratados com violência diariamente. Nem mesmo os idosos são poupados pelos militares.
Radioagência NP: Rose, há quanto tempo as famílias quilombolas ocupam a área que está em disputa?
Rose Meire dos Santos Silva: É de geração, há mais de 200 anos. Os nossos bisavós morreram nesta terra, derramaram o sangue trabalhando como escravos. Minha bisavó trabalhava aqui, a minha avó tem 112 anos. E tem cerca de 40 anos que a Marinha invadiu a nossa área e expulsou mais de 70 famílias. Essa ordem de despejo está dizendo que a comunidade é dentro da base naval, mas não é.
Radioagência NP: Como é a relação com os militares no dia a dia?
RMSS: A gente não vai para a vila deles, só passa por dentro porque é um caminho que a gente sempre fez, desde antes de eles fazerem as casas no local. É a única passagem que a gente tem, mas gostaríamos de construir um caminho por fora. Enfim, a relação entre a Marinha e a comunidade é de violência.
Radioagência NP: Você pode descrever como são essas ações?
RMSS: A marinha chega aqui na comunidade com granada e fuzil. Eles maltrataram a minha avó e hoje ela está em cima de uma cama. Um sargento matou uma pessoa da comunidade em frente ao nosso quilombo. A relação é esta: a gente sendo vigiado 24 horas e eles encapuzados no fundo de nossas casas, agredindo os moradores.
Radioagência NP: Em que contexto essa vila de militares foi construída?
RMSS: Essas casas foram construídas para os militares e são ocupadas por cabos e sargentos. Para elas serem construídas, foram expulsas mais de 70 famílias. Algumas pessoas morreram, outras foram morar debaixo do viaduto e as demais moram de aluguel até hoje.
Radioagência NP: Qual é a principal fonte de renda?
RMSS: A nossa fonte de renda é roça, apesar de a Marinha não estar deixando a gente trabalhar. Tem pessoas no local que fazem azeite e produzem frutas, mas eles estão colocando veneno nos pés de manga e jaca, estão acabando com as plantações da gente.
Radioagência NP: Além da titulação das terras, quais as demais necessidades dos quilombolas?
RMSS: Aqui não existe direitos humanos. Nesta comunidade, a maioria é analfabeta. Não sabe ler nem escrever, só sabe trabalhar na roça. A gente tenta conseguir colégio para os nossos com muita dificuldade lá fora. Aqui dentro, tem condições de colocar colégio, posto médico, energia, rede de esgoto e água, mas a Marinha não deixa entrar nada disso.