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Esquecidos por grande parte da sociedade e pelo poder público, especialmente pela prefeitura de São Paulo, os moradores de rua da maior e mais rica cidade brasileira encontram nas instituições não governamentais e grupos religiosos a saída para manter a pouca dignidade social e esperança que lhes restam.
Nem o frio nem a fome. O que mais incomoda essas pessoas é o tratamento desumano e muitas vezes violento aplicado pelas forças policiais. Matheus Alves de Oliveira tem 16 anos – na rua desde os 12 – não hesita em falar da agonia vivida quase que diariamente.
“Por qualquer coisinha os policiais já querem agredir. Tem vez que o pessoal do rapa chega para pegar os colchões e os cobertores, nós saímos correndo e ele jogam spray de pimenta, sem nem perguntar nada”, conta o garoto. Rapa é uma gíria para os funcionários da Central de Atendimento Permanente de Emergência (Cape), órgão da prefeitura cuja função é atender a população em situação de rua.
O jovem Matheus, que sonha em ser mestre de capoeira, disse que já recorreu ao abrigo municipal do M’boi Mirim, mas que desistiu. “Não gostei do ambiente”, justifica. Os abrigos e albergues públicos paulistanos vêm sendo alvo constante de críticas devido às superlotações e maus tratos, além da falta de higiene.
O coordenador da Fundação Projeto Travessia, Marcelo Caran, lida com cerca de 130 crianças e adolescentes em condição de rua, no centro de São Paulo. Ele conta que “não existe de fato um trabalho (público) de construção de um processo de reversão dessa situação. O que vemos são abordagens truncadas, equivocadas, muitas vezes desrespeitosas e violentas, que visam apenas a limpeza das ruas da região central, é uma verdadeira ação higienista”.
Recentemente o prefeito paulistano Gilberto Kassab demonstrou, com sarcasmo a situação dos moradores de rua nos albergues. Ele postou em seu twiter uma mensagem dizendo que “o astral dos moradores de rua está muito bom, acho que é porque o frio deu uma trégua”. Ele foi alvo de duras críticas em redes sociais e instituições que lidam com essas pessoas.
Marcelo assegura que “se todos os moradores de rua optassem por sair das ruas hoje, não haveria uma estrutura de acolhimento adequado”. Ele garante que muitas pessoas preferem dormir ao relento a frequentar esses ambientes (de abrigos e albergues municipais). “Temos depoimentos de meninos e meninas adolescentes que não querem ir justamente em razão da forma como são tratados”, revela o ativista.
Uma das educadoras do Projeto Travessia, Tânia Lima, diz que a Guarda Civil Metropolitana é a mais despreparada para lidar com os jovens moradores de rua. Ela conta que além de buscar aproximar o jovem abandonado de sua família, “a inserção dos adolescentes nos grupos comunitários dentro dos bairros em que os familiares residem é muito importante, pois assim é mais fácil mantê-los próximos à sua casa.”
O jovem Matheus conta ainda que não espera nada da prefeitura, que “em vez de dar alguma coisa, só toma o que é nosso”. Para ele, quem realmente ajuda nos cuidados básicos “são as instituições, as ONGs e o ‘pessoal da igreja’, que leva comida, dá cobertor, leva roupa, leva a gente para tomar banho, ora e conversa com a gente”, explica o garoto.