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Foi assim que, no dia 4 daquele mês, em uma reunião na cidade de São Paulo, começou a funcionar o Foro de São Paulo. Hoje, 20 anos depois, a esquerda da região tem muito a comemorar, mas ainda muitos desafios pela frente.
É dentro desse espírito – de balanço, festejos e reflexão – que acontece de 17 a 20 de agosto, em Buenos Aires (Argentina), o 16º Encontro do Foro de São Paulo. O evento é um espaço de discussão entre partidos e organizações políticas de esquerda da América Latina e Caribe.
A reunião tem como objetivo definir caminhos para ampliar a unidade dos partidos progressistas, aprofundar as mudanças vividas nessas duas décadas, derrotar a contra-ofensiva da direita e consolidar a integração regional. A temática já aponta para os obstáculos que esses grupos precisam enfrentar.
A trajetória
Ao longo de sua existência, o Foro tem ajudado na resistência ao neoliberalismo, na caracterização do capitalismo e do imperialismo contemporâneos e na elaboração das ideias gerais das alternativas democráticas e populares.
Teve papel decisivo para estabelecer as bases de um novo conceito de integração e unidade regional, que inclui o respeito à soberania e à identidade de cada país e um sentido de solidariedade entre os povos. Indicações que afloram na política externa de vários governos latino-americanos.
Sim, porque, nesses anos, o quadro mudou muito para essas forças, em especial desde 1998, com a eleição de diversos governos de esquerda. Se antes o esforço era para conseguir preservar a experiência cubana, agora há um processo continental de mudanças, em maior ou menor intensidade. “Quando o Foro surgiu, todos nós éramos oposição e resistência”, recorda Ricardo Alemão Abreu, secretário de Relações Internacionais do PCdoB e membro do Grupo de Trabalho do Foro.
“Mas houve um fortalecimento dos movimentos sociais e das forças políticas de esquerda, que chegaram aos governos nacionais – alguns estabelecendo um processo revolucionário, outros implementando um outro caminho de mudanças, cada um respondendo às novas realidades de cada país”, completa.
Para Alemão, o mérito dessas forças foi justamente a capacidade de analisar o momento e saber se adequar a um novo tempo. “Foi saber se atualizar, se fazer contemporâneo”, opina.
Nesse sentido, ele destaca a importância do Foro: “É um grande espaço de reflexão e análise, de elaboração e ação. Confluiu ali todo o pensamento político crítico e alternativo da região. Surgiu para promover a unidade e cooperação entre os partidos, que redundou em cooperação entre os governos”.
Ricardo Alemão citou como exemplo dessas discussões no Foro o combate à Alca e a decisão de construir organismos alternativos, que agora criam corpo com o Mercosul, a Alba, a Unasul e, recentemente, a Celac.
“As idéias que esses governos progressistas colocam em prática agora foram produtos desses debates. O Foro não só fez oposição ao neoliberalismo, mas também se preparou para essa nova etapa, construindo uma plataforma para orientar as conquistas”, coloca.
O contexto hoje
O documento prévio do Foro, que ainda está em debate, menciona que a guinada à esquerda na América Latina tem se refletido em ações concretas de defesa à soberania e proteção aos povos, como a saída “das tropas norte-americanas da base de Manta, no Equador, e a campanha contra as bases na Colômbia e contra a reativação da 4ª Frota”.
Também ressalta que o continente, onde há mais governos progressistas, é o local que melhor tem resistido às conseqüências da crise econômica, que, segundo o texto, abre uma janela de oportunidade para as esquerdas, que precisam se preparar.
“O capitalismo está em crise, mas muito longe de estar morto. Só desaparecerá de “morte matada” e não de “morte morrida”. E para que isto ocorra é necessário que exista uma força alternativa capaz de superá-lo, em escala nacional e mundial”.
O texto também alerta para uma reação da direita, citando a eleição de candidatos retrógrados, o golpe em Honduras e a instalação das bases na Colômbia. “Como evitar que o governo norte-americano e a direita oligárquica sigam se fortalecendo? Como a esquerda deve atuar no futuro imediato para responder a essa nova ofensiva?”, pergunta o documento, propondo a discussão.
Como o 16º Encontro do FSP acontece a menos de um mês das eleições legislativas na Venezuela e a dois das presidenciais brasileiras, o assunto eleitoral deve entrar na pauta. “O resultado destas eleições causará forte impacto na situação regional, particularmente as eleições presidenciais que vão realizar-se na Argentina, Guatemala e Nicarágua, bem como no Peru, em 2011”, destaca o texto.
O documento menciona ainda a importância de democratizar os meios de comunicação, como forma de frear esta contra-ofensiva: “a contra-ofensiva da direita exigirá dos governantes progressistas e de esquerda da região, a ampliação da hegemonia política, que supõe a adoção de medidas que aprofundem a democracia, inclusive na comunicação social e os meios massivos de comunicação”.
A reunião do FSP acontecerá em um momento em que Colômbia e Venezuela buscam uma saída diplomática para o conflito desencadeado após denúncias do ex-presidente colombiano, Álvaro Uribe, de que guerrilheiros das Farc estaria abrigados em território venezuelano.
O tema também deve entrar na agenda, onde há uma mesa de debate sobre defesa. “O Foro não discute só resistência, mas a ação, a partir dos governos. E já há resultados desse trabalho, como o Conselho de Defesa Sul-Americano. A solução de debater esse conflito -fomentado pelo imperialismo -no âmbito da Unasul é uma política estabelecida no Foro”, explica Alemão.
Programação
Durante o evento, também acontecerá o 2º Encontro das Juventudes e a reunião de fundações e escolas de partidos membros do Foro. “Os partidos de esquerda se preocupam com a renovação e têm uma ligação forte com a juventude. Também sentem necessidade de um maior intercâmbio do debate político, de teorias, das pesquisas. Por isso, será criado o Observatório de Governos de Esquerda e Progressistas, para disponibilizar informações sobre esses governos e analisar essas ações”, informa Alemão.
Além dos debates e da aprovação da resolução, na plenária final, os participantes do Foro de São Paulo também terão uma audiência com a anfitriã Cristina Kirchner, presidente da Argentina.
“Outro mundo é possível, mas é preciso decidir qual. As esquerdas da America Latina e do Caribe têm que definir uma identidade própria, recolhendo sua vasta experiência, nos governos e nos movimentos sociais, para estabelecer as propostas programáticas e ideológicas. A diversidade deve ser agora a fonte de sua capacidade propositiva”, resume o texto do Foro.
Da Redação,
Joana Rozowykwiat