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Denominado por “Representação política e interesses particulares na saúde”, o estudo afirma que não é fácil comparar a relação entre as empresas de saúde e os governantes, mas sugere que pode haver troca de favores ou de compromissos e envolvimentos anteriores do candidato com o setor da saúde suplementar.
“A possibilidade desse lobby é enorme e vai contra os interesses da sociedade”, diz Mário Scheffer. Segundo o pesquisador, as operadoras de saúde nunca estiveram ao lado do Sistema Único de Saúde (SUS) e têm um histórico marcado por exclusão no atendimento de pacientes.
Em 1993, a operadora Golden Cross, por exemplo, se recusou a atender o irmão da jornalista Roseli Tardelli, Sérgio Tardelli, que estava internado no Hospital 9 de Julho, em São Paulo, em decorrência da aids. Roseli expôs o assunto na mídia, liderou manifestações e conseguiu por decisão judicial o direito de ter seu irmão atendido. Mas as poucas possibilidades de tratamento da aids na época impediram a recuperação de Sérgio, que faleceu em novembro de 1994.
“Meu irmão nunca tinha precisado usar o convênio. Era disciplinado, praticava esportes, se alimentava bem, mas quando precisamos recorrer à internação, eles negaram…”, lembra Roseli. Desde então, ela se engajou no assunto e, em 2003, criou a Agência de Notícias da Aids.
Os defensores dos direitos das pessoas vivendo com HIV e aids obtiveram outra grande conquista contra as operadoras em 1998, quando foi aprovada a Lei 9656/98, obrigando os planos de saúde a atenderem os portadores do vírus.
Mas até hoje, segundo levantamento feito pela Agência Aids, pacientes soropositivos que usam planos de saúde queixam-se do atendimento.
Fernanda (pediu para não ter seu nome verdadeiro divulgado) diz que quando solicita um exame relacionado ao tratamento da aids, como as análises de carga viral no sangue, há mais demora na liberação por parte das operadoras. “Cheguei a esperar 3 dias para receber o aval da realização desse exame, enquanto que para um ultra-som sai no mesmo dia”, comentou.
Já Marcos (também nome fictício), contou que o atendimento dos infectologistas especializados em aids, cadastrados nos planos de saúde, é muito superficial. “Para atender mais pessoas, as consultas médicas duram apenas 10 minutos. O médico nem encosta no paciente”, reclamou.
Candidatos que mais receberam
A campanha a deputado federal do médico e ex-presidente da Unimed de Santa Catarina Dalmo Claro de Oliveira (PMDB-SC) foi a mais apoiada por uma empresa de plano de saúde. Dalmo recebeu mais de R$ 2.3 milhões da Unimed e não foi eleito, mas foi nomeado Secretário Estadual de Saúde.
A campanha de Dilma Rousseff (PT) recebeu R$ 1 milhão da Qualicorp Corretora de Seguros S/A e a de José Serra (PSDB) R$ 500 mil.
Entre os governadores eleitos, os que mais receberam verba de planos de saúde foram Geraldo Alckmin (PSDB-SP), R$ 400 mil; e Sergio Cabral (PMDB-RJ), R$ 170 mil.
Os senadores foram Walter de Freitas Pinheiro (PT-BA) e Eduardo Amorim PSC-SE, ambos receberam R$ 60 mil.
Marco Aurélio Ubiali (PSB-SP) foi o deputado federal eleito com mais apoio, R$ 285 mil; seguido pelo ex-ministro da Saúde José Saraiva Felipe (PMDB-MG), com R$ 270. Saraiva se envolveu em algumas polêmicas quando ministro. Em 2005, durante reunião do Conselho Nacional de Saúde, ele utilizou o termo “aidético” ao se referir a uma pessoa com aids, e foi muito criticado por ativistas e representantes das pessoas que vivem com essa doença.
O médico libanês Pedro Tobias (PSDB-SP) foi o deputado estadual eleito com maior apoio, R$ 90 mil. Na última legislatura, ele foi um dos maiores defensores da polêmica lei que destina até 25% dos leitos em hospitais públicos administrados pelas OS (Organizações Sociais) às pessoas com planos privados de saúde.
Ao analisar a distribuição de recursos entre os partidos, a maior fatia foi para o PMDB, com 28,52% das doações, seguidos pelo PSDB (18,1%) e PT (14,5%).
Empresas que mais doaram Um total de 49 empresas de planos de saúde fizeram doações para as eleições do ano passado. Apesar de em 2006, 62 empresas terem feito doações, houve um aumento de 42% nessa última eleição, ou seja, cerca de R$ 5 milhões a mais.
As que mais doaram foram a Unimed do Estado de São Paulo – Federação Estadual das Cooperativas Médicas com R$ 3.75 milhões; e a Qualicorp Corretora de Seguros S/A com R$ 1.9 milhão.
Por meio da sua assessoria de imprensa, a Unimed informou que as doações efetuadas foram feitas de forma transparente, dentro dos preceitos da legislação eleitoral e da ética cooperativista. “Neste contexto, a aproximação política aconteceu no sentido de ecoar os nossos pleitos, principalmente os tributários e regulatórios, bem como de apresentar algumas propostas, pois entendemos que temos muito a contribuir não só com o setor de saúde, mas com as comunidades nas quais estamos inseridos”, destacou a nota.
A Qualicorp respondeu apenas que “a empresa que atua no ramo de corretagem de seguros fez doações a partidos e candidatos, indistintamente, nos termos da legislação brasileira vigente.”
Segundo o estudo “Representação política e interesses particulares na saúde”, R$ 64,2 bilhões foi o faturamento anual do setor em 2009; mais de 1000 empresas de planos de saúde médico-hospitalares atuam no mercado; e 46 milhões de usuários estão vinculados aos planos de saúde.
A pesquisa conclui que é necessário tornar a representação dos planos privados de saúde, ainda que legítima, mais transparente, equitativa, menos fragmentada e mais próxima da defesa dos interesses da sociedade.
Acesse o estudo completo aqui.